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25 de Abril de 2024
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    A Responsabilidade das ferramentas de pagamento em compras virtuais

    Publicado por Daniele Nascimento
    há 4 anos

     A tecnologia trouxe aos consumidores inúmeros benefícios, entre eles, a facilidade de realizar compras sem sair de casa. Devido à grande gama de lojas e marcas, há maior oferta de produtos e serviços, o que contribui com a busca por preços mais acessíveis. Tudo isso muitas vezes na palma das mãos a um clique.

     Com o avanço da tecnologia em conjunto com o acesso à internet, surgiram também empresas que têm como objetivo intermediar o pagamento de venda de produtos ou comercialização de serviços. São as chamadas ferramentas de pagamento, as quais ofertam segurança em negociações realizadas pela internet, como por exemplo: Mercado Pago, PagSeguro, PayPal, EBANX, entre outras.

     Estas empresas atuam única e exclusivamente na intermediação de pagamento. O pagamento é realizado através da ferramenta e posteriormente a empresa responsável transfere o valor ao vendedor.

     É importante frisar que, como condição para negociar com segurança, cada empresa possui regras e prazos específicos para que o consumidor possa reclamar do pagamento por um serviço ou produto não entregue.

     Diante deste cenário, surgiram alguns problemas, como em toda relação negocial. Entre os mais comuns está o descumprimento de oferta, configurado quando o consumidor cumpre sua parte na negociação (realiza o pagamento), mas não recebe o produto ou o serviço contratado, nos termos dos arts. 30 e 35 do Código de Defesa do Consumidor.

     Além disso, não são raras às vezes em que o consumidor é vítima de fraude, ou seja, faz a compra com um vendedor supostamente confiável, efetua o pagamento por meio de uma ferramenta de pagamento que lhe oferta segurança, contudo, após a concretização da negociação, este vendedor simplesmente desaparece.

     Nesses casos, o consumidor não vê outra possibilidade para reembolso do valor pago, a não ser buscar a empresa responsável pela intermediação do pagamento.

     Ocorre que, com o avanço de tais práticas criminosas, muitas empresas de pagamento, com o intuito de evitar assumir o risco e o prejuízo, simplesmente alegam não ter responsabilidade sobre a entrega do produto ou serviço.

     A justificativa apresentada é que são apenas responsáveis pela intermediação do pagamento e, por conta disso, não fazem a análise do perfil do vendedor e não comercializam o produto ou serviço adquirido pelo consumidor.

     Sabemos, porém, que as empresas que têm a intermediação de pagamento como finalidade de prestação de serviço, são remuneradas para tanto.

     Assim, nasce a indagação: as ferramentas de pagamento que oferecem segurança nas compras pela internet são responsáveis por fraudes ou desacordo comercial que trazem danos ao consumidor?

     Depende, pois atualmente o Judiciário não firmou um entendimento unificado com relação a esta responsabilidade, sendo necessário analisar o comportamento do consumidor e empresa, caso a caso, para configurar ou não esta responsabilização.

     Neste diapasão, citamos duas jurisprudências, uma que compreendeu pela responsabilização, outra pela falta de responsabilidade por parte da ferramenta de pagamento:

    Negativa a atribuição de responsabilidade:

    EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. VENDA DE PRODUTO EM SITE DA INTERNET. MERCADO LIVRE. MODALIDADE "MERCADO PAGO". E-MAIL ENCAMINHADO AO AUTOR INFORMANDO QUE A COMPRA FOI APROVADA. ENCAMINHAMENTO DO PRODUTO AO SUPOSTO COMPRADOR. FRAUDE DE TERCEIRO. VÍTIMA QUE NÃO SEGUIU AS ORIENTAÇÕES DE SEGURANÇA DO SITE. ROMPIMENTO DO NEXO CAUSAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA QUE MERECE MANUTENÇÃO. INEXISTÊNCIA DE PONTO OBSCURO, CONTRADITÓRIO OU OMISSO A SER ESCLARECIDO. NÃO CONSTITUEM OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECURSO ADEQUADO PARA MANIFESTAÇÃO DE INCONFORMISMO. ARTIGO 1022 DO CPC/15. EMBARGOS QUE SE CONHECEM, MAS QUE SE REJEITAM.
    (TJ-RJ - APL: 00117836220168190021, Relator: Des (a). BENEDICTO ULTRA ABICAIR, Data de Julgamento: 12/02/2020, SEXTA CÂMARA CÍVEL)

    Responsabilidade atribuída:

    APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA DE DANOS MATERIAIS C/C AÇÃO REPARATÓRIA POR DANOS MORAIS. ¿MERCADO LIVRE¿. ADMINISTRADORA DE COMÉRCIO ELETRÔNICO. FRAUDE CONSUBSTANCIADA NO CADASTRO DA CONSUMIDORA. COMPRAS NÃO RECONHECIDAS. DIFICULDADES EM RESOLVER A QUESTÃO EM SEDE ADMINISTRATIVA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE NÃO COMPROVADAS. CARACTERIZADO O FORTUITO INTERNO. DANOS QUE SUPERAM OS DO MERO ABORRECIMENTO DO COTIDIANO. QUANTUM FIXADO A TÍTULO DE DANO MORAL ADEQUADO AO CASO. PRESTÍGIO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. DESPROVIMENTO DO RECURSO.
    (TJ-RJ - APL: 00272801520158190066, Relator: Des (a). LUIZ FELIPE MIRANDA DE MEDEIROS FRANCISCO, Data de Julgamento: 12/05/2020, NONA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 2020-05-15)

     Diante dos julgados, fica evidente que a responsabilidade apenas será atribuída caso seja comprovada a falha na prestação do serviço, pois, de fato, seria impossível que as empresas responsáveis pela intermediação do pagamento evitassem toda e qualquer fraude causada por terceiro, além disso, cabe ao consumidor também tomar atitudes mínimas a fim de evitar ser vítima de golpistas.

     Inicialmente, a relação entre comprador e ferramenta de pagamento é tipicamente uma relação de consumo, por estar clara a figura do consumidor (adquirente) e fornecedor (ferramenta de pagamento), que tem como sua prestação de serviço, intermediar, com segurança, o pagamento da venda de produtos e serviços.

     No entanto, ainda que a responsabilidade do fornecedor, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, seja objetiva (independe de culpa), é possível afastar o dever de indenizar caso seja demonstrada a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, conforme estabelecem os artigos 12, § 3, III e 14, § 3, II do CDC.

     Em complemento, inclusive, em pesquisas de jurisprudências do último ano no TJRJ, há inúmeras decisões desfavoráveis ao consumidor, pelo fato de ter ficado demostrado a culpa exclusiva do próprio.

     Com relação às Instituições Bancárias, recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 03/09/2019, pacificou o entendimento que o Banco emissor de boleto bancário não responde por dano a cliente que não recebeu produto comprado pela internet (REsp 1786157).

     Na ocasião, a relatora Ministra Nancy Andrighi, concluiu que:

    “Se as instituições financeiras fossem consideradas pertencentes à cadeia de fornecimento em qualquer hipótese de venda fraudenta pela internet, "todos os bancos operando no território nacional, incluindo operadoras de cartão de crédito, seriam solidariamente responsáveis pelos vícios, falhas e acidentes de produtos e serviços que fossem adquiridos utilizando-se um meio de pagamento disponibilizado por essas empresas, o que definitivamente não encontra guarida na legislação de defesa do consumidor".

     Sendo decidido que não houve falha na prestação do serviço bancário, já que a instituição financeira apenas emitiu a guia de pagamento.

     Contudo, situação diferente ocorre com ferramentas de pagamento que se propõem a dar segurança na realização de negócios pela internet.

     Essas ferramentas, em geral, fazem ampla publicidade, em anúncios televisivos ou pela internet, levando ao consumidor uma legítima expectativa de que, ao utilizar tais meios, terá o suporte necessário caso venha enfrentar qualquer tipo de problema. Além disso, integram a cadeia de consumo, pois lucram com tal prestação de serviço.

     Geralmente essas intermediadoras de pagamento possuem regras próprias para garantia da segurança, as quais o consumidor deve se atentar para conseguir realizar uma compra segura e evitar dores de cabeça ao buscar efetuar uma reclamação.

     Com isso, listarei alguns cuidados que o consumidor deve ter para evitar cair no golpe e ver a responsabilidade da ferramenta de pagamento afastada:

    • Verifique as regras e procedimentos da ferramenta de pagamento

     Ao decidir comprar pela internet, antes de concluir o pedido e pagar, conheça as regras e procedimentos da ferramenta de pagamento. Isto porque cada empresa possui regras contratuais e procedimento próprios para realização da intermediação do pagamento, como, por exemplo, prazo para reclamar ou garantia somente quando a compra é feita pela própria plataforma. Assim, é necessário verificar este procedimento, para evitar cair em golpes e situações em que a responsabilidade da ferramenta de pagamento poderá ser afastada.

    • Jamais aceite realizar o pagamento por fora da ferramenta

     Um artifício comum utilizado por vendedores mal-intencionados é atrair o consumidor para fora da ferramenta. Ou seja, depois que o consumidor faz a compra corretamente, recebe um contato do vendedor orientando a fazer o pagamento (total ou parcial) por fora da plataforma, seja por um boleto enviado por e-mail ou, ainda, por depósito em uma conta bancária de sua titularidade. Nesses casos, responsabilizar a ferramenta de pagamento é muito difícil.

    • Havendo problema na negociação, reclame no prazo!

     A maioria das empresas de pagamento que solicitam que o comprador, dentro de um determinado prazo, informe sobre o recebimento ou não do produto ou serviço, como meio de garantir a segurança ofertada e intervir em eventual problema.

     Portanto, cumprir esse prazo é de extrema importância para que o consumidor tenha sucesso no ressarcimento dos valores desembolsados. Pois, caso não tenha recebido sua compra, ficará difícil a responsabilização da ferramenta de pagamento, por falta de atenção às regras contratuais firmadas.

     É válido ressaltar, ainda, que a exigência dessa comunicação e o prazo estabelecido sejam previamente informados aos consumidores, já que o direito à informação é um direito básico do consumidor, conforme estabelece o artigo , III, do CDC.

    • Sempre desconfie de preços muito vantajosos ou produtos milagrosos

     Se a oferta de um produto ou serviço for muito atraente, diferente do comum, com promessas exageradas e características impressionantes, tome cuidado. Esses recursos de vendas agressivos são indícios de fraude. Evite cair em golpes!

     Inclusive sobre este tópico, há inúmeros julgados que afastaram a reponsabilidade da ferramenta de pagamento atribuindo-a a culpa exclusiva do consumidor, pelo fato do baixo preço do produto, o que é um enorme indício de fraude.

     Assim, por todo o exposto, percebe-se, portanto, que a segurança ofertada por essas intermediadoras de pagamento é somente parcial, em detrimento do que muitas vezes aparenta em suas campanhas publicitárias.

     Isto porque se propõem a garantir que o repasse do valor pago seja realizado de forma segura e eficiente, mas estabelecem regras próprias para essa garantia, o que muitas vezes não fica claro ao consumidor.

     Com isso, faz-se necessária a comprovação de falha na prestação de serviço por parte da plataforma de pagamento on-line.

    Referência:

    Banco emissor do boleto não responde por dano a cliente que não recebeu produto comprado pela internet. STJ, 2020. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Banco-emissor-do-boleto-nao-responde-por-danoacliente-que-nao-recebeu-produto-comprado-pela-internet.aspx>

    • Sobre o autorAdvogada atuante na área Direito do Consumidor, Cível e Família
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